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Barquinho em alto mar

  • Foto do escritor: Miriele Alvarenga
    Miriele Alvarenga
  • 20 de nov. de 2023
  • 3 min de leitura

Atualizado: 5 de dez. de 2023


Na fragilidade e na instabilidade, apenas a mercê das marolas ou tempestades… Uma brisa é capaz de ditar para onde seguir, e um furcão nos coloca de repente de cabeça pra baixo. O vento o leva para onde sopra e as grandes ondas desestabilizam seu prumo.

O que pode, o barquinho à deriva em seu próprio mar?

Ele existe mas não sabe navegar. Passivo e silencioso, o som que ele dança é do que há ao seu redor.

Ele não escolhe as coordenadas e tão pouco sabe  reconhecer o norte…

Um mar calmo, dizem, não faz bom marinheiro… “Mas para quem não almeja ser marinheiro e conhecedor dos segredos do mar, de que serve passar pelas tormentas?” O barquinho, sozinho, uma noite se pergunta tomado pelo desespero da aparente passividade, dependência e impotência em seu destino.

Por um tempo… sem a mínima ideia de terra ao longe ou sem saber se outros barquinhos também correm seus cursos por ali, ele só pode se deixar levar. Não é dia de marola, nem de tissunami, e o barquinho as vezes só boia parado com a mesma paisagem ao seu redor por horas… Ele congela no frio e vislumbra as cores do céu no verão, ele não sabe muito bem como foi parar tão longe, mas sente que o mar participa o tempo todo de sua empreitada involuntária e surpreendente. É nele, talvez no mar, que esteja sua maior segurança. E, ao se dar conta disso, teme, por um minuto, acabar encalhado em alguma baía distante de casa ou no fundo do oceano, esquecido e invisível.

Estar ao sabor do vento… Sem aquele instinto e faro forte de bicho, o barquinho tem dificuldade para saber onde atracar. Não sabe para onde ir e também não possui autonomia o suficiente para escolher o próprio percurso. Ele anseia um marujo competente, forte e sábio que o coloque em jornada de desbravar as águas escuras de um mar sombrio e inquieto. Aquele de semblante suave e decido, despreocupado e corajoso, aventureiro, competente, e que não desrespeita as vontade do mar. Sem navegante, o barquinho pode afundar ou ir parar à beira da orla deixando para trás a possibilidade de continuar um percurso de futuro e curiosidade. A jornada é perigosa para o barquinho, mas também guarda o sabor doce da novidade e do frescor da incerteza.

As vezes, na noite estrelada ou de luar, o barquinho conversa com o céu e com o mar:

“Assim, em silêncio, você percebe a quantidade de água que desloco em você com minha desprezivel massa corporal? Percebe as ondinhas que de mim saem quando saio flutuar? Posso não ter um bom mapa ainda ou alguém que me navegue daqui de dentro, mas se eu não estivesse aqui, você ainda seria o mar, mas seria o mar sem mim.”

Quem é o mar sem mim? Quem sou eu sem o mar? O barquinho no mar, também é mar. E aos pouquinhos, sabendo que o mar, bravo ou mando está a seu favor, ele, mesmo sem vento se poe a navegar e quando na tempestade, lança mão de uma âncora e permanece firma e aterrado. A terra é chão até para um barquinho, e os tesouros do oceano estão disponíveis lá no fundo, bem no fundo... quando ele de si se abandona e resolve mergulhar.

Está paciente e determinado a esperar, quer abrigo, mas também quer desbravar, está cansado, mas não pode parar. Deseja o céu, e está no mar.



 
 
 

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